Antelóquios

  O que são exatamente Antelóquios? De acordo com o dicionário:

antelóquio: do Lat. anteloquiu; s. m., aquilo que se diz antes; prefácio; prólogo.

No caso, Antelóquio nada mais é que um exercício literário simples. Pega-se uma notícia real, disponível aos borbotões na Internet, e cria-se uma ficção anterior ao fato narrado. Só isso. Não há compromisso com a verdade. Não há preocupação com os envolvidos. Simplesmente é utilizado um fato real para inspirar uma narrativa fictícia. Gostou da idéia? Faça um Antelóquio e me mande. Quem sabe eu não coloco aqui, junto com os meus? Notícias bizarras acontecem todos os dias, apenas aguardando que alguém inspirado as aproveite. Quer exemplos? Abaixo segue uma sequência de Antelóquios criados por mim.

ATENÇÃO: Todos os textos aqui expostos são trabalhos de FICÇÃO. A responsabilidade pela veracidade dos fatos das notícias referidas é totalmente dos veículos apontados. Caso a exploração de alguma notícia ofenda ou difame alguém pessoalmente, peço que entre em contato comigo, que ela será imediatamente retirada.
 


Friday, November 10, 2006

Cabeça-dura

por Alexandre Heredia

- Não!

- Sim!

- O verde!

- O azul!

- Macarrão!

- Churrasco!

- Vamos, só uminha...

- Eu já disse que estou com dor de cabeça!

- Pô, tem três calcinhas penduradas no chuveiro!

- Eu lembro de tirar se você lembrar de baixar a tampa da privada!

- Mas só um choppinho...

- Não, você não pode. Hoje eu quero ver minha mãe!

- Um dia eu ainda te mato...

- Mata nada! Vai logo lavar essa louça!

- Quem?

- Aquela loirosa peituda ali! Vai dizer que não reparou?! Cínico!

- Eu quero o divórcio...

- Não coloca o copo direto na mesa! Usa a PORRA do aparador!

- Me ouve...

- Quieto! Tá na hora da novela!

- Quer me ouvir? Por favor...

-Chama logo o elevador! Vai, meu! Tá olhando o que?!

- Se você não me ouvir agora eu...

- Eu quero! Eu preciso! Compra!

- Eu tô te avisando...

- Banana! Frouxo! Fracassado!

--

Adivinha só como isso TINHA que terminar:
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI1242294-EI5030,00.html

Friday, October 06, 2006

O Sexo dos Anjos

por Alexandre Heredia

"Ai, que perrengue!", pensou o Cupido, levando angelicalmente as mãos em suas partes.

Fazia muito tempo que ele não se aliviava. Aquele lance de ser sempre o galheteiro, temperando pro outros comerem, era demais. Afinal, ele também era filho de Deus!

A vida no paraíso era, literalmente, um inferno. Só cânticos, solos monótonos de harpas e pessoas felizes. Nenhum pecado para aliviar as tensões, nenhuma chance de uma fornicaçãozinha básica num canto de nuvem. Parecia que só ele pensava naquilo!

Não dava mais para agüentar! Precisava se aliviar, e agora! Só precisava encontrar um lugar reservado e pronto. Olhou para um lado e viu uma roda de querubins cantando louvores. De outro um grupo de idosos caminhava, trocando memórias. Ainda não. Não era bom. Precisava de algo discreto.

Até que finalmente viu um grupo de crianças que brincava de esconder entre os cúmulos, e teve uma idéia. Aproximou-se e pediu para brincar também. Foi recebido com alegria e inocência, o que quase o fez desistir de sua diabrura. Quase. Assim que um dos garotos começou a contar, ele bateu rápido suas pequenas asas e se escondeu em uma cinzenta nuvem de chuva. Caso o Chefe o visse por lá, era só dizer que estava brincando com os garotos. Tinha até testemunhas. Tirou a toga da cintura e começou a manipulação. "Ah, que delícia, que delícia!". O perrengue era tanto que em poucos minutos já havia terminado. Só para não perder a chance tocou mais uma. E outra.

Um, dois, três, está com você!

Brincou mais um pouco e foi embora, a prova de seu crime bem escondida naquela nuvem de chuva.

Ninguém perceberia!

--
Será?
http://noticias.terra.com.br/brasil/interna/0,,OI1177960-EI306,00.html

Monday, June 05, 2006

O outro Daniel

por Alexandre Heredia

- Quero fazer uma reclamação!

O velho funcionário observou a figura à sua frente. Se não estivesse andando e falando, dificilmente seria reconhecível como humano. Era apenas uma massa disforme de carne, ossos e sangue. A cabeça pendia sobre o peito, presa apenas por tendões.

- Pois não?

- Olha meu estado!

- Estou vendo.

- E então?

- E então o que?

- Não vem com essa. Não era para ser assim. E você sabe disso.

- Sei?

- Claro!

O velho coçou a longa barba. Tentou afastar da mente imprecações que não cairiam bem aos olhos do patrão. Ele sim, sabia de tudo o que acontecia. Pensou em pedir a alguém que trouxesse uma aspirina, mas sabia que seria impossível. Suspirou.

- Me deixa ver seu caso. Nome?

- Daniel.

- Completo?

- Kurabstienchencko.

- Japonês, hein? Desculpe. Está aqui, nada de errado. Quero dizer, nenhuma falha processual. Tudo foi cumprido nos conformes. Veja: até a assinatura oficial está no lugar. Fora a ironia, o resto está tudo OK.

- Mas por que? O que eu fiz para merecer? Sempre fui um bom homem. Caridoso, penitente. Sabe quantas vezes forniquei em toda minha vida? Nenhuma! Pode ver aí em seu registro. Quando tinha pensamentos pecaminosos passava o dia inteiro rezando.

- Pois é, a vida é assim...

- Eu deveria ser é canonizado! Eu nunca duvidei de nada! Nunca! Aliás, foi por causa dessa fé que eu entrei lá! E o que eu ganho por uma vida inteira de abnegação e trabalho? Isso!

Estava difícil acompanhar o discurso do pobre-coitado, pois sua cabeça estava numa posição bastante ruim, completamente invertida, e aquilo com certeza estava bagunçando as referências espaciais dele, pois agitava os braços desengonçadamente, enquanto cambaleava de uma lado para o outro, tentado se equilibrar no pouco que restava de suas pernas.

- Olha - começou o velho, já acostumado com aquele tipo de reclamação - você precisa compreender que não é bem assim que as coisas funcionam. Fé não precisa de prova, senão não seria chamada de "fé", e sim de "prova". Não se tenta provar algo improvável. Simplesmente se acredita.

- Mas eu acredito! Sempre acreditei, tanto que entrei lá sem medo nenhum!

- Mas entrou por soberba. Queria provar que estava certo. Aí, meu amigo, babau...

- Babau?

- Babau. Aliás, não posso nem deixar você entrar por causa disso. É uma pena, mas o senhor vai ter que pegar o elevador.

- Não, espera! Quero falar com o Homem...

- Você acha que ele tem tempo para todo mundo que reclama da vida? Não, desculpe, não será possível. Por favor, siga estes senhores até o elevador. Chegando lá em baixo entregue esse papel e...

- Não! Nem a pau! Me solta! Eu era um santo! UM SANTO! Isso não pode acontecer comigo.

- Me desculpe, mas regras são regras. Se serve de consolo, já erramos antes. Veja a Joana D'Arc, queimamos ela e depois a transformamos em santa. Pode ser que seu gesto no futuro possa ser utilizado como marketing, e aí você volta rapidinho. Mas não tenha muitas esperanças. Os tempos são outros, as histórias vem e vão, aparecem e desaparecem em questão de horas. Está cada vez mais difícil separar a fé verdadeira da insanidade absoluta. Antigamente, veja você, chegamos a canonizar até mesmo um cachorro. Um cachorro! Você imagina o entrave burocrático que isso foi?

Enquanto falava, o velho funcionário acenou aos guardas que encaminhassem o condenado ao elevador. Ele se debateu e sujou tudo com sangue, mas não tinha músculos suficientes para lutar contra, e foi jogado. Antes de entrar, olhou para os lados com a cabeça pendendo dos ombros e abriu a boca, pronto para uma súplica. Mas antes que conseguisse vocalizá-la, foi chutado para dentro do elevador, que fechou as portas com um baque.

- Cada um que me aparece... - reclamou o velho, batendo os respingos de sangue de sua toga. Seria um verdadeiro inferno tirar aquelas manchas. Suspirou. - Quem é o próximo?

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O que aconteceu ANTES disso?
http://noticias.terra.com.br/mundo/interna/0,,OI1032946-EI294,00.html

Monday, May 08, 2006

Sobre bolas e gatos

por Alexandre Heredia

- Vai...

- Espera, me dá mais um beijo...

- Beija ele. Olha lá, está olhando para você.

- Bobo!

- Você não fica com pena? Olha só, ele está dando até cabeçadas...

- Deixa então que eu faço um carinho.

- Isso... Agora dá um beijinho nele.

- Pra quê a pressa?

- Tá bom. Vem cá...

- ...

- ...

- Ei, pára com isso!

- O quê?

- Não empurra minha cabeça pra baixo. Você sabe que eu não gosto assim.

- Desculpa.

- Pô, não força. Deixa rolar...

- É que daqui a pouco chega tua mãe, e aí já viu, né?

- Não faz assim! Pô, você sabe que eu não sou galinha.

- Quem te chamou de galinha? A gente tá junto faz quanto tempo? Só uma chupadinha. Olha, ele tá esperando...

- Ai, que vergonha! Nunca fiz isso.

- Não tem segredo. Faz, vai?

- Tá bom.

- Isso. Humm, que coisa boa...

- Eca!

- O que foi?

- Enroscou um pentelho na milha língua. Ptui!

- Não esquenta, é assim mesmo. Não para agora... Isso. Que gostoso! Ei, o que foi isso?

- Mmm?

- Não pára! Não foi nada. Humm. Isso. Tô quase lá. Anh... Vai, vai, vai... Que barulho é... Hum! Ah! AAAAAAAAIIIII!!

O que aconteceu?!?
http://www.estadao.com.br/ultimas/mundo/noticias/2006/mai/07/1.htm

Wednesday, March 29, 2006

Emboscada

por Alexandre Heredia

Shirley desligou o motor de seu velho carro e suspirou. Pela janela observou a rua típica de periferia americana, com seus sobrados e jardins de cercas brancas. Sempre sonhou em possuir uma daquelas, mas infelizmente não era por aquele motivo que estava lá. Tirou os tênis e trocou-os pelos sapatos de salto que combinavam com o vestido. Do painel do carro recolheu o retângulo de metal com seu nome, que espetou em sua blusa. Puxou o retrovisor e verificou a maquiagem. Aparentemente nada fora do lugar.

"O que eu fiz de tão errado?", perguntou-se, enquanto olhava a pequena valise no banco do passageiro. O logotipo "AVON" parecia zombar dela. Diploma universitário, pós graduação, cinco anos de experiência corporativa, e de repente lá estava ela, precisando daquele tipo de bico para sobreviver. Um só revés e sua vida virou do avesso. Garota "AVON Chama". Ninguém merece.

Mas não adiantava ficar daquele jeito. Aceitara se sujeitar, não tinha porque se acovardar na última hora. Passou a noite inteira estudando a brochura que lhe foi fornecida. Se considerava, sem falsa modéstia, uma especialista em unhas e tipos de esmalte. Era naquilo que se focaria, aquele seria seu porto seguro. Só precisava sair do carro.

Abriu a porta e saiu para a calçada. Antes que conseguisse trancar a porta ouviu um farfalhar em uma sebe próxima. Virou-se, assustada, mas não viu nada. Sentiu-se uma estúpida. "Com medo do vento, Shirley?". Sacudiu as chaves, tentando novamente trancar a porta. Mas então ouviu um rosnado baixo, quase imperceptível, e o mato da sebe se moveu novamente. Agora não era o vento. Novo ruído, o rosnado mais alto. E se fosse um cachorro raivoso? Morria de medo de cachorros! Em pânico, enfiou a chave na fechadura da porta do carro e girou-a. Puxou a maçaneta e a porta não se mexeu. O ruído era bastante alto agora, impossível de não perceber. Ela tremia. Enfiou novamente a chave e desta vez conseguiu destrancar a porta. Mas assim que escancarou-a, um silvo chegou a seus ouvidos, e um baque atingiu suas costas. Gritou. Não era um cachorro!

O que era?! Hein? Hein?
http://ultimosegundo.ig.com.br/materias/mundo/2322501-2323000/2322867/2322867_1.xml

Monday, February 13, 2006

Ledo Engano

por Alexandre Heredia

- Psiu...

- Hum?

- É, você mesmo. Pode me ajudar?

- Pois não, moça?

- Eu tava a fim de levar vinte gramas.

- Perdão?

- Vintinho. Cê sabe...

- Não, não sei. Do que você está falando?

- Pô, não dá uma de Migué. Eu tô ligada que você sabe onde está a parada. Vai dar uma de João Sem-Braço comigo?

- Mocinha, eu não faço idéia do que você quer...

- Pô, que trafica mais noiado! Quero erva, saco! Do que você acha que eu estou falando, pomba?!

- Só pode ser brincadeira...

- Olha eu tô na febre. Eu sei que você tem unzinho aí, não vem me enrolar. Sou informada, sei que chegou um carregamento ontem. É só vintinho, não dói nada. Cê dá o bagulho, pega a grana e pronto. Sem erro.

- Você está falando sério?

- Tô com cara de humorista? Quebra essa, cara.

- Você está maluca? Se o chefe descobre me mata...

- Só vintinho! Ele nem vai perceber. Olha, tá aqui a grana na minha mão. Vai lá, separa a paranga e me trás. Teu chefe nem vai notar!

- Caralho...

- Vai lá! Não tem erro. É pé lá, pé cá, e eu saio de fininho. Ninguém se enrola, fica tudo entre a gente...

- Tá bom. Fica aí que eu já volto.

- Belê.

Descubra como terminou essa negociata em:
http://noticias.terra.com.br/popular/interna/0,,OI875876-EI1140,00.html

Wednesday, January 18, 2006

Gohan, o Ratinho

por Alexandre Heredia

Sem que houvesse opção, Gohan adentrou na toca da fera, pronto para encarar seu destino. Sempre se considerou bastante esperto, mesmo para um mero rato, mas sabia que talvez sua esperteza de nada serviria contra a selvageria de seu oponente. Ainda assim não entrou em pânico. Não acreditava realmente em destino, e sabia que tudo era uma questão de descobrir como atacar o problema. E o problema não demorou a aparecer, na forma de um corpo comprido e escamoso, cabeça em forma de cunha, língua bífida e olhos ameaçadores. Gohan não conseguiu evitar de engolir em seco.

- Olá, Almoço - sibilou a cobra, já salivando entre as presas afiadas.

- Meu nome é Gohan, e não Almoço.

- Dá no mesmo...

Gohan observou a cobra se aproximando, arrastando-se lentamente pelo piso. Em pouco tempo estaria pronta para o bote, e o ratinho veria sua garganta por dentro em seguida. "Pensa rápido, Gohan!", ficava repetindo para si mesmo. Alheia a seu conflito, ou mesmo se alimentando dele, a cobra o cercava lentamente com o longo corpo.

- Chega maissss... - disse ela. Gohan, num súbito rompante de inspiração, obedeceu sem pestanejar. Caminhou alguns passos até chegar perto da cabeça da serpente, que, tomada de surpresa, não atacou.

- Já me apresentei. Sou Gohan. E você?

A cobra virou os olhos, confusa.

- Sou Aochan.

- Prazer, Aochan. Eu apertaria sua mão, mas, bom, você não tem mãos... Aliás, desculpe minha impertinência, mas a senhora não está muito magra?

- Tenho comido pouco. Isso está para mudar...

- Pois não deveria. Sabia que a senhora está muito elegante? Coisa fina, se me perdoa o trocadilho. Aposto minha cauda que as outras cobras morrem de inveja desse seu corpinho perfeitamente tubular. Não é verdade?

- Não conheço outras cobras...

- Não?! Que absurdo a inveja, não é mesmo? Aposto que elas ficam por aí, em suas tocas, só se remoendo, loucas para serem como a senhora.

- Você acha?

- Acho não, tenho certeza. Aposto que elas passam o dia inteiro destilando veneno por sua causa. Se bobear enfiam o rabo na garganta só pra vomitar a refeição. Por inveja, por vergonha. A senhora não. Aposto que tem um baita orgulho desse seu corpão.

- Nunca pensei nisso.

- E modesta, além de tudo! Eu sempre disse para meus amigos que as cobras eram criaturas segregadas. Puro preconceito. E a senhora é um belo exemplo! Bela e modesta. Espera só eu contar para eles... Ei, que barulho é este?

- É meu estômago. Desculpe...

- O que é isso, não tem nada do que se desculpar. Todos nós sabemos que a beleza precisa de sacrifícios. Eu mesmo nunca consegui isso. Sempre comi todo tipo de lixo. Olha só, quantos pneuzinhos! Sou uma granada de colesterol. Queria ter a sua força de vontade. A senhora conseguiu rejeitar sua natureza, e olha só o resultado! Linda, linda! É uma pena sermos de raças diferentes, porque senão...

- Hi, hi, hi!

- É verdade! Veja essas escamas brilhantes! E estes olhos! Adoro pupilas como a sua. Ei, cuidado com essa língua, acabamos de nos conhecer...

- Hi, hi, hi!

- Chega pro canto. Quero te ver com aquela luz ali. Putz, se eu tivesse uma câmera! É coisa para capa de revista. Já imaginou sua foto numa revista?

- Pára...

- É sério! Aposto que seria um arraso.

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Será? Veja como este xaveco terminou em:
http://noticias.terra.com.br/popular/interna/0,,OI838453-EI1141,00.html